Segundo a CPT-Cedoc (Comissão Pastoral da Terra e Centro de Documentação Dom Tomás Balduíno), entre 1995 e 2022 foram resgatadas do trabalho análogo à escravidão no meio rural 60.366 pessoas. A maioria em propriedades do agronegócio.
Em 2003, ano inaugural de Lula na presidência, ocorreram grandes avanços, como a assinatura do I Plano Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo, que prevê várias políticas de prevenção: combate e assistência aos resgatados; criação da Conatrae (Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo), agora ameaçada de ser transferida do Ministério dos Direitos Humanos para o Ministério do Trabalho; a instituição da “lista suja”, que divulga os nomes dos empresários e empresas flagrados ao utilizar mão-de-obra escrava; e a nova redação do artigo 149 do Código Penal, centrado na proteção da dignidade dos trabalhadores ao incluir como características do trabalho escravo: o trabalho forçado, a servidão por dívidas, jornadas exaustivas e condições degradantes no local de moradia e trabalho.
Os estados nos quais mais se flagraram esse tipo de delito são Mato Grosso e Pará. E há predominância no setor sucroalcooleiro, pois trabalhar em canavial transforma os empregados em máquinas de corte sob sol forte e submetidos a movimentos repetitivos.
Também foram encontrados trabalhadores em situação análoga à escravidão no agronegócio do Oeste baiano; na produção de carvão para siderurgia em Minas Gerais; no monocultivo de árvores, erva-mate e maçã, no Sul do país; no extrativismo vegetal; e até em vinícolas gaúchas de marcas sofisticadas, como Salton, Aurora e Garibaldi.
Em 2014, o Congresso aprovou emenda constitucional que prevê o confisco de propriedades que comprovadamente utilizem trabalho escravo. As desapropriações seriam destinadas à reforma agrária ou urbana. Mas sabemos todos que no Brasil a Justiça é excessivamente lenta quando se trata de punir o capital…
Com o golpe Temer ao governo Dilma, houve redução das equipes do Grupo Móvel de Fiscalização de nove para quatro… Durante a pandemia, os fiscais não trabalharam devido às restrições. Agora, no entanto, a fiscalização se intensifica, sobretudo graças às denúncias da sociedade civil.
Jamais se encontrou o menor indício desse abominável crime em acampamentos e assentamentos do MST, nem em suas agroindústrias ou cooperativas.
Frei Betto é escritor, autor de “Aldeia do silêncio” (Rocco), entre outros livros.
.