Publicado no site Terra Madre Brasil
“Não basta defender os Direitos Humanos em palavras e textos. É preciso retornar às bases populares”, aponta Frei Betto sobre a militância da agricultura familiar.
Um dos grandes símbolos de resistência durante a Ditadura Militar na Igreja Católica, Frei Betto conta com uma trajetória marcada pela defesa dos Direitos Humanos no país. Autor de 69 livros editados no Brasil e no exterior, foi premiado com o Jabuti de literatura pelas obras Batismo de Sangue (1982) e Típicos Tipos – perfis literários (2005). O escritor, jornalista e religioso esteve presente no Terra Madre Brasil 2020, na programação Diálogos do Terra Madre Brasil – Outros Caminhos Possíveis, junto com o músico e pesquisador de cultura afrobrasileira Tiganá Santana. O diálogo tinha previsto a participação de Jerá Guarani, impossibilitada pela dificuldade de conexão à internet.
Sara Campos: Poderia comentar o momento mais impactante durante a conversa que contou com sua participação no Terra Madre Brasil?
Frei Betto: Gostei de toda a conversa. Considero que toda ela foi impactante.
Sara Campos: O senhor possui uma larga experiência como defensor dos Direitos Humanos. No contexto político atual acredita que a militância desta pauta precisa passar por mais transformações?
Frei Betto: Sim, não basta defender os Direitos Humanos em palavras e textos. É preciso retornar às bases populares e promover intensa atividade de formação em Direitos Humanos junto a lideranças de movimentos populares e pastorais, sindicatos e associações, enfim, de todos os setores organizados no universo da periferia e da zona rural, onde vivem os marginalizados e excluídos.
Sara Campos: De que forma a agricultura familiar pode contribuir para a garantia dos Direitos Humanos nas áreas rurais do país?
Frei Betto: A agricultura familiar assegura 70% dos alimentos que nos chegam à mesa. No entanto, o governo concede muito mais recursos ao agronegócio, que exporta o que produz, goza de isenções tributárias absurdas (como a lei Kandir) e representa apenas 0,27% do imposto recolhido no país. A valorização da agricultura familiar é a solução para evitar o aumento da miséria no campo e nos livrar do império das gigantes manipuladoras do mercado alimentício, como Monsanto, Basf e outras produtoras de transgênicos. Além disso, é a agricultura familiar que conserva o saber agrícola ancestral, que nos salva do excesso de agrotóxicos e, portanto, de tantas enfermidades daí decorrentes.
Sara Campos: Seu nome esteve entre os grandes nomes do Programa Fome Zero, do governo Lula. Acredita que a sociedade civil pode contribuir com esse legado em ações que não envolvam o Governo Federal?
Frei Betto: Sim, como faz o Slow Food ao valorizar as produções artesanais e a agricultura familiar. Bom exemplo disso são os assentamentos do MST, baseados na agricultura orgânica e no sistema produtivo de partilha.